Muito se fala hoje da “Indústria 4.0” mas, enquanto alguns a vêm como ficção científica, em muitos lugares ela já é realidade. Especialistas prevem que esta nova “revolução industrial” será a base para qualquer desenvolvimento econômico e países que não consigam adotá-la estarão fadados ao subdesenvolvimento. Três pilares se destacam para uma transição a este novo modelo econômico:
- investimento em indústrias complexas interligadas em redes;
- investimento em pesquisa e novas tecnologias;
- investimento em educação e formação.
Meu tema para os próximos posts aqui será a educação.
Fim do modelo tradicional de desenvolvimento.
Dani Rodrik, da Harvard University, nos alerta que o modelo tradicional de desenvolvimento de países que pretendem ultrapassar seus limites econômicos, como houve na Alemanha pós guerra, na Coreia do Sul e na China recentemente, não mais acontecerá no futuro. Sabemos pela história que o modelo de desenvolvimento no séc. XX seguiu certas etapas:
- criação de mão de obra barata para atrair investimentos e aumentar a manufatura e exportação;
- aumento da qualidade da educação, tecnologia e pesquisa para formar indústrias próprias que, no começo, copiavam os modelos de quem nos países produzia e, num segundo momento formava, pelo investimento em empresas nacionais, novas possibilidades;
- aquecimento do mercado interno para assegurar autossuficiência e se distanciar de um modelo dependente de outros países;
- exportação da mão de obra barata para outros países.
O que Rodrik está nos dizendo hoje é simplesmente que o último item, este que dava a oportunidade de “passar a bola” para outros países subdesenvolvidos seguirem o mesmo modelo, simplesmente acabou.
Segundo ele, e aqui na Europa consideram que ele tem razão, a China, ao automatizar sua mão de obra barata, está tirando a possibilidade de outros países usarem esta como início de desenvolvimento – e começamos a falar de “desindustrialização precoce”, afinal, antes mesmo de haver a possibilidade de industrialização, mesmo oferecendo mão de obra barata, esta suposta possibilidade é aniquilada pela automatização de países que já implementam esta tecnologia. Assim, a indústria 4.0 passa lentamente a ser a única opção de sobrevivência na economia mundial.
Mudança dos tipos de emprego.
2016 já é considerado por muitos um ano “negro” para a indústria aqui na Bélgica. Empresas diversas em setores diversos demitiram milhares e milhares de trabalhadores: Caterpillar, ING, AXA, IBM, etc, “you name it“, a lista é bem grande e, em um país de pouco mais de 11 milhões de habitantes, milhares de pessoas aparecem rapidamente nas estatísticas. Portanto, o nível de desemprego tem diminuindo nos últimos anos, e continua, mesmo com estas demissões em massa que andam aqui acontecendo. Além do que, outro dado interessante, é que, a maioria destas empresas que andam ou fechando ou demitindo em massa na Bélgica, estão bem, lucrando, avançando e, mesmo suas filiais belgas trazem bons ganhos.
O que se passa então?
Basicamente o que anda acontecendo é uma mudança do mercado de trabalho que visa a indústria 4.0: empregos que podem ser substituídos por novas tecnologias tendem a sumir e empregos que desenvolvam, implementem e façam a manutenção destas tendem a aumentar. O Rodrigo Medeiros tem feito algumas menções a esta realidade aqui no blog que valem à pena serem lidas (aqui e aqui).
Muito se fala da robótica na industria 4.0 mas normalmente se esquece que esta é apenas a parte mais “ficção científica” mostrada pela mídia.
O mundo do “management”, introduzido nos anos 80 e que inflou os andares de secretariados e chefias nas empresas, está também em vias de diminuir drasticamente assim como os trabalhos braçais de trabalhadores sem formação. Não devemos esquecer também que para além dos trabalhos suscetíveis à computadorização há a questão do retorno dos investimentos. A robotização custa milhões mas pouco se fala dos softwares que custam alguns mil capazes de substituir vários tipos de serviço.
E se há algo que a indústria 4.0 tem de “político”, é que ela não escolhe “quem” ela pode substituir.
Desafios para a educação
Em um estudo publicado pela University of Oxford em 2013 sobre a suscetibilidade de empregos serem computadorizados já fica claro que não apenas o tipo de emprego aumenta a possibilidade dele ser computadorizado mas também o nível educacional do empregado. Toda esta mudança que hoje já ocorre aqui na Europa rumo à indústria 4.0, tem um viés extremamente baseado na educação, na formação, na pesquisa e, principalmente na autonomia, criatividade e capacidade de adaptação do ser humano, bases determinantes para este novo mercado de trabalho.
Em modelos empresariais muito mais horizontalizados e empresas e serviços interligados em redes, o desenvolvimento humano, pessoal e social faz toda a diferença. Mostraremos em breve que Finlândia e Coreia do Sul, entre outros, tem sido paradigmas econômicos exatamente pelo seu investimento em educação aliado ao desenvolvimento de sua complexidade econômica. Mas sim, não é “qualquer” educação e nem a quantidade de horas escolares que fazem a diferença e sim os tipos de educação e seus resultados pessoais e como sociedade.
Mas isto já é a questão do próximo post.
Por enquanto, ficamos na “educação 1.0”, uma base que não mais basta e que, visto aqui de fora, é infelizmente a base que o Brasil ainda nem bem alcançou e já anda com políticas de destruí-la; triste…
Com certeza há uma questão de planejamento de investimentos e visão de desenvolvimento da complexidade econômica no Brasil que carece de políticas e qualquer seriedade. Minha contribuição aqui porém é argumentar que, adicionado a isto, há toda uma política de educação essencial para a criação de um espaço lógico, social e humanos necessário para transgredir a realidade redundante de um país, agora mais do que nunca.
notas:
https://www.bmbf.de/de/zukunftsprojekt-industrie-4-0-848.html
https://www.ft.com/content/de07e776-2172-11e5-ab0f-6bb9974f25d0